segunda-feira, 5 de abril de 2010

MINHA DESPEDIDA DE MIRANDA (4/04/10)

Pe. Paulo Nunes de Araujo


UM TEMPO PARA CHEGAR E UM TEMPO PARA PARTIR


Caros irmãos e irmãs aqui presentes, queridos rádio-ouvintes. Assim diz "Aquele que fala à assembléia”, o Cohélet ou Eclesiastes: “Há um momento para tudo, e um tempo certo para cada coisa debaixo do céu. Tempo para nascer, e tempo para morrer. Tempo para plantar, e tempo para colher. Tempo para destruir, e tempo para construir. Tempo para chorar, e tempo para rir. Tempo para abraçar, e tempo para separar-se. Tempo para procurar, e tempo para perder. Tempo para calar e tempo para falar. Tempo para a guerra, e tempo para a paz” (Ecl 3,1-2.3b.4a.5b-6a.7b.8a).

Percebemos aí que a palavra-chave é “tempo”. Segundo o poeta argentino Martin Fierro, o tempo é “a tardança daquilo que está por vir”, mostrando que o tempo é um processo que se realiza do futuro para o presente. Realmente, o que passou é graça, é dádiva; a nossa expectativa é com o que está por vir. É em função do futuro que nos preparamos, nos entusiasmamos, contamos com o apoio outro, e pedimos as bênçãos de Deus, como nos ensina o apóstolo Paulo: “esqueço-me do que fica pra trás e avanço para o que está na frente. Lanço-me em direção à meta” (Fl 3,13).

Depois de dezesseis meses (1º/11/2008 a 4/04/2010) de boa convivência humana e primorosa solicitude pastoral aqui na Paróquia Nossa Senhora do Carmo, em estreita colaboração com o Pe. Altair Rossati, amigo de presbitério e irmão de sacerdócio, e de auxílio à Diocese de Jardim, tomo a liberdade de acrescentar ao texto do Eclesiastes, que há também um tempo para chegar e um tempo para partir. É preciso assumir mais um novo desafio pastoral, ciente que “nem tudo que se enfrenta pode ser modificado, mas nada pode ser modificado até que seja enfrentado” (Albert Einstein, físico alemão).

Assim, em atenção ao telefonema de Dom Jorge Alves Bezerra, no dia 3/03, às 13h46, fui à cidade de Jardim com o intuito de conversar com ele, no dia 8/03, às 10h. Após um agradável e generoso diálogo, Dom Jorge conferiu-me o cuidado pastoral da Paróquia Nossa Senhora do Perpétuo Socorro como Administrador Paroquial, na cidade de Caracol, MS, com unânime aprovação do Conselho Presbiteral e do Colégio de Consultores desta Diocese de Jardim. E definiu o dia 4 de abril (Páscoa do Senhor) como a data da minha nomeação, durante a Santa Missa das 19h.

Honestamente, é uma missão que muito me lisonjeia e honra, pela confiança a mim depositada. Mas é com humilde disposição que procurarei servir aquela “porção do Povo de Deus” (Constituição Dogmática Lumen Gentium sobre a Igreja, de 21/11/1954, n. 23), com a clara consciência que o evangelho, a igreja e reino pertencem à Jesus. Por isso, como dizia João Batista, “é necessário que ele cresça e eu diminua” (Jo 3,30).

Nesse tempo de atuação aqui em Miranda, busquei sempre, com autenticidade, ser do jeito que eu sou, com minhas qualidades e qualificações, fraquezas e limitações, até porque “o presbítero, antes de tudo é pessoa humana” (Documento da CNBB, 75, n. 4). Já nos primórdios da Igreja, o apóstolo Paulo ensinava que “trazemos este tesouro (Jesus) em vasos de argila (nossa quebrantabilidade)” (2Cor 4,7). Recordo também, dentro do espírito deste Ano Sacerdotal, São João Maria Vianney, o padroeiro dos padres, que dizia: “Se ao morrer me desse conta de que não existe nada de positivo e de que errei durante toda a minha vida, isso não mudaria nada para mim. Ficaria feliz por ter errado acreditando sempre no Amor”.

Cito ainda o psiquiatra norte-americano David D. Burns, que na lida com os seus filhos, admitiu o seguinte: “fiquei surpreso ao saber que me amavam mais por eu ser capaz de admitir erros, pois aí eu ficava mais humano” porque, conclui ele, “somos mais inteiros (íntegros) quando sentimos falta de algo”. No horizonte da fé cristã, esse “algo” é a graça de Deus. Ninguém se basta a si mesmo. Sabemos que a graça de Deus é abundante (Cf. Rm 5,20), mas “a graça supõe a natureza. E a aperfeiçoa” (Sto. Tomás de Aquino), ou seja, a graça se edifica na natureza, e a natureza humana é falha. Assim sendo, somos sempre carentes da graça divina. É ela que nos completa, nos torna inteiros, nos aperfeiçoa.

Porém, sempre assumi a minha pequenez na confiança do salmista: “Senhor, não te lembres de meus desvios, nem dos pecados da minha juventude. Lembra-te de mim, conforme o teu amor” (Sl 25/24,7), e na humildade do apóstolo Paulo: “pela graça de Deus sou o que sou: e sua graça em mim dispensada não foi estéril” (1Cor 15,9-10a).

Assim sendo, parto desta Paróquia com a consciência tranqüila e serena de quem cumpriu o seu dever (veja as fotos neste meu blog). De fato, no que se refere à pastoral ordinária, ministrei 503 Missas, 42 batizados, 6 casamentos, e 12 Primeiras Comunhões, além de dezenas de unções aos enfermos e centenas de confissões. Afora isso, contribui na produção de diversos subsídios para os “grupos de reflexão” e a Grande Semana Missionária, proferi várias palestras para a formação de lideranças e agentes de pastoral. Nesse bojo, destaco ainda a criação da Escola Bíblia Paroquial e o lançamento do meu livro: “Conhecer e praticar a Palavra de Deus”, o qual já está na sua segunda edição. Tudo isso em profunda comunhão com o Magistério da Igreja e em atenção cuidadosa a “integridade da doutrina” (Cf. 1Tm 1,3; 4,6; 6,3-4.20; 2Tm 1,14; 4,3; Tt 1,9; 2,1.7; 3,8; Gl 1,7-10).

Neste momento, faço minhas as palavras do apóstolo Paulo aos presbíteros de Éfeso: “Vós bem sabeis como procedi para convosco todo o tempo, desde o dia em que cheguei... Eu servi ao Senhor com toda humildade, com lágrimas, e no meio das provações que me sobrevieram pelas ciladas... E nada do que vos pudesse ser útil eu negligenciei de anunciar-vos e ensinar-vos, em público e pelas casas. Pois não me esquivei de vos anunciar todo o desígnio de Deus para vós... Em tudo vos mostrei que é afatigando-nos assim que devemos ajudar os fracos, tendo presentes as palavras do Senhor Jesus, que disse: ‘há mais felicidade em dar do que em receber’” (At 20,18b-20.27.35).

A Dom Jorge Alves Bezerra, que realmente acolheu-me como “filho e amigo” (Constituição Dogmática Lumen Gentium, n. 28; Cf. Decreto Christus Dominus, sobre o múnus pastoral dos bispos na Igreja, de 28/10/1965, n. 16; Catecismo da Igreja Católica, n. 1567), desde o dia 13/11/2008, quando fui conversar com ele em Jardim, a minha altíssima gratidão e respeito. À minha família (mãe e irmãos), que me acolheu em casa, muitas vezes sem entender direito as minhas circunstâncias, o meu sincero amor, uma dívida que jamais conseguirei pagar (Cf. Rm 13,8a). Ao Pe. Altair Rossati Ferreira, que se mostrou verdadeiro “amigo e irmão”, conforme a “Pastoral Presbiteral” pede, a minha elevadíssima estima, o que também é extensivo aos outros colegas deste presbitério. Enfim, a todos os paroquianos e paroquianas, o meu profundo e cordial reconhecimento; que Deus lhes pague por tudo.

Para concluir, retomo aqui as palavras do papa Bento XVI, na ocasião da sua eleição, a 19/04/2005, pois também me coloco como “um simples e humilde trabalhador da vinha do Senhor”. Por isso, seguindo as palavras do papa, “consola-me o fato de que o Senhor sabe trabalhar e atuar com instrumentos tão insuficientes e, sobretudo, confio em vossas orações. Na alegria do Senhor ressuscitado, confiados em sua ajuda permanente, sigamos adiante. O Senhor nos ajudará. Maria, sua santíssima Mãe, está do nosso lado”. Muito obrigado!

 
©2007 '' Por Elke di Barros